ASSALTO AO BANCO CENTRAL DE FORTALEZA- A HISTORIA VERDADEIRA
Assalto ao Banco Central de Fortaleza – A história verdadeira
Antonio Celso dos Santos Delegado da Polícia Federal Presidiu o inquérito |
Prestes
de completar seis anos do maior assalto do Brasil o delegado da Polícia
Federal Antônio Celso dos Santos, que presidiu as investigações conta
como tudo aconteceu
Prestes
a completar seis anos, o roubo do Banco Central de Fortaleza voltou aos
noticiários com a estreia do filme “Assalto ao Banco Central”,
megaprodução nacional dirigida por Marcos Paulo. Nos dias 6 e 7 de
agosto de 2005 foram roubados do cofre do banco R$ 164,7 milhões --em
notas de R$ 50--, quantia que consagrou o assalto como o maior da
história do país e o segundo maior roubo a banco do mundo.
O
Ministério Público Federal denunciou mais de 120 suspeitos por
envolvimento no crime, dos quais 36 teriam participação direta no
assalto. Do total de denunciados, quase 50foram condenados, 11 foram
absolvidos e 65 aguardam julgamento. Restam dois foragidos, que vivem em
vilarejos do sertão do Ceará tal qual o bando de Virgulino Lampião:
fugindo da polícia, praticando crimes e intimidando a população local.
O
UOL Notícias conversou por telefone com Antônio Celso dos Santos,
delegado da Polícia Federal que, com uma equipe fixa de no máximo dez
agentes, presidiu as investigações do crime e interrogou todos os
envolvidos. Atualmente trabalhando como adido da PF no Paraguai, o
delegado contou detalhes das investigações e fez críticas aos livros e
ao filme sobre o assalto –que, segundo ele, estão longe de relatar os
fatos com verossimilhança.
Segundo
Santos, a PF conseguiu resgatar cerca de R$ 20 milhões em espécie –R$
18 milhões em duas apreensões realizadas no ano do crime. Já o BC
recuperou R$ 20,3 milhões com bens adquiridos com o dinheiro do assalto,
cujos valores de mercado são muito inferiores aos que foram pagos pelos
criminosos nas operações para lavar dinheiro. Para o delegado, “não há
como recuperar mais dinheiro”, em razão do tempo que já se passou.
O
assalto foi um exemplo de ousadia dos criminosos. Com equipamentos
rudimentares, eles conseguiram cavar um túnel de 90 metros da casa que
alugaram até o cofre do BC e levar três toneladas de dinheiro sem serem
notados. As conseqüências do crime, contudo, foram catastróficas para os
envolvidos, que se tornaram vítimas de extorsões por parte da polícia e
de outros criminosos e foram caçados de modo implacável pela polícia,
dada a magnitude do crime.
Abaixo, o delegado da Polícia Federal relembra o crime e conta detalhes inéditos.
O ASSALTO
"O
assalto foi praticado por três grupos, dois de São Paulo e um do
Nordeste. A fita (ideia) do crime quem recebeu foi o Alemão (Antônio
Jussivan Alves dos Santos, o principal líder dos criminosos), quando ele
estava em Fortaleza para roubar uma carga e conheceu o Deusimar [Neves
Queiroz] e o Luiz Eduardo [Moura Mota], dois vigilantes que trabalhavam
em uma transportadora de dinheiro e sugeriram que ele roubasse o BC.
Eles conheciam o cofre, e falaram que roubar o BC é muito mais fácil do
que se imaginava. Depois, o grupo começou a organizar o assalto em uma
casa de praia perto de Cumbuco (litoral do Ceará) e tomou conhecimento
de como era o cofre por meio de fotos que o Deusimar tirou por celular.
Eles sabiam onde estavam as câmeras, que não eram boas, não filmavam
nada, e sabiam a parte em que estava o dinheiro que não era rastreado.
De
posse dessas informações, eles alugaram a casa e começaram a cavar o
túnel, que tinha 89 metros e era equipado com iluminação,
ar-condicionado, revestido com lona e madeira. O túnel era estreito, uma
pessoa um pouco mais gorda não passaria. Eles furaram o chão do cofre
com maquitas (produto usado para cortar cerâmica), que funcionam com
discos de diamante, porque se eles quebrassem o piso o alarme iria
disparar. Quando eles chegaram na caixa forte, começaram a carregar o
dinheiro em baldes cortados no meio, que eram puxados por cordas. Eles
tiraram o dinheiro entre a noite de sexta e a madrugada de sábado.
Depois começaram a distribuir. Cada um foi para um canto do país: Goiás,
Piauí, Pará... "
R$ 6 MILHÕES NA CARRETA
"No
dia 9, chegou a informação de que uma carreta da empresa JR Transportes
saiu com um bocado de carros no domingo, e que o dono, o José Charles
[Machado de Morais], que éirmão de um conhecido assaltante [apelidado de
Cabeção, que participou do assalto] viajou junto. Rastreamos a carreta.
Enquanto isso, o motorista da carreta, que não tinha nada a ver com o
assalto, reparou que o chefe estava nervoso, estranhou a urgência do
transporte dos carros e, durante uma parada na estrada, decidiu olhar
dentro dos carros para ver o que tinha lá. Ele achou um bolo de notas de
R$ 50 e logo associou aquilo com o assalto. O José Charles disse para
ele ficar quieto.
Quando
ele chegou perto de um posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF),
decidiu entrar com a carreta no posto para se livrar do problema. Foi
bem na hora que uma equipe nossa estava chegando no local. A gente
planejava fazer um ‘cavalo deTroia’, e usar o caminhão para chegar até
outros bandidos, mas alguém da PRF já tinha vazado a informação. Nesse
dia, o Jornal Nacional soltou que haviam achado R$ 40 milhões dentro de
um caminhão-cegonha. Aí nossos planos de chegar até outros criminosos
com o caminhão foram por água abaixo. Tivemos que contar o dinheiro.
Tinha cerca de R$ 6 milhões."
R$ 12 MILHÕES EM MONDUBIM
"Com
a prisão do José Charles, que estava muito nervoso e não era um cara do
crime, conseguimos pistas dos demais. Achamos, inclusive, o número do
celular que batia com o do cartão encontrado no túnel. O telefone era de
um amigo do irmão dele, conhecido como Negão, que estava freqüentando
uma casa emMondubim (periferia de Fortaleza). Ficamos sabendo de uma
reunião que teria lá. Nesse dia, a gente decidiu que iria ‘estourar’
(invadir) a casa.
SOBRE O FILME E OS LIVROS
Livros contam a história de "Assalto ao Banco Central"
Roubo inspira megaprodução nacional "Assalto ao Banco Central"
"Interpreto o pior tipo de bandido que existe no mundo", diz Eriberto Leão sobre personagem em "Assalto ao Banco Central"
"Assalto ao Banco Central" romantiza maior roubo do país
Estávamos
em um bar e, coincidentemente, dois dos criminosos foram até esse local
para comprar comida. Aproveitamos para entrar na casa e pegar os outros
três que estavam ali dentro. Quando abrimos a porta, tinha R$ 12
milhões em espécie. Era uma pilha de 60 centímetros de altura e dois
metros de comprimento. Ali achamos umas anotações com a divisão do
dinheiro de assalto e a identidade dos demais. Daí foi questão de tempo
para chegar nos outros."
NÃO HÁ COMO RECUPERAR MAIS DINHEIRO
"O
bem que foi subtraído é volátil. As notas não estavam em série. Os bens
comprados pelos assaltantes foram adquiridos com valores muito acima do
real, já que eles tinham urgência em se desfazer do dinheiro. Eles
gastaram o dinheiro de tudo que é jeito, com fazendas, casas, carros,
lanchas, postos de gasolina, com mulher, com farra, pagaram dívidas...
Tudo que se possa imaginar. Os criminosos também perderam muito dinheiro
com extorsões. Não há mais como recuperar o dinheiro do assalto."
FORAGIDOS NO SERTÃO
"Os
dois foragidos vivem em vilas próximas de Boa Viagem (a 217 km de
Fortaleza). É o Antônio Artenho da Cruz, vulgo Bode, e o Juvenal
Laurindo. Eu mesmo já fui umas quatro vezes, com uma equipe da Polícia
Federal, para tentar prendê-lo, mas não consegui. Eles sempre conseguem
fugir. Todo mundo na região conhece esses caras. Ou é amigo, familiar.
Qualquer movimento estranho de alguém de fora eles avisam os caras, que
conseguem fugir.
O
Juvenal mora em uma fazenda em que é preciso percorrer 60 km numa
estrada de terra para chegar. No caminho, há várias vilas, nas quais os
moradores avisam o Juvenal quando há algum movimento estranho, seja por
medo ou por amizade. Na última tentativa de pegar ele nós copiamos um
caminhão de boia-fria que passa todos os dias na região recolhendo os
trabalhadores. Ninguém percebeu nosso disfarce, mas quando a gente
chegou na fazenda do Juvenal, uns burros começaram a relinchar, e a luz
de uma das casas da fazenda se apagou. Corremos para tentar pegar o
Juvenal, mas ele escapou. A casa era da irmã dele. Uma outra vez quase
pegamos o Antônio Artenho, mas ele não tava em casa.
Tinha
ido a um córrego próximo e conseguiu fugir. A região ali é muito
propícia para eles fugirem. É caatinga, mas tem uma mata alta, é uma
área extensa que não dá para cercar. Mas eu acredito que eles a prisão
deles é questão de tempo. Eles vão ser presos por outros crimes que
continuam praticando na região. Eles não param de cometer crimes. O
Juvenal, por exemplo, é suspeito de ter cometido várias mortes, algumas
por conta do assalto ao Banco Central."
ENVOLVIMENTO DO PCC
"Quase
todos os paulistas que participaram do assalto eram vinculados ao PCC
(Primeiro Comando da Capital). Alguns eram até respeitados, estavam em
um nível alto na hierarquia, eram donos de boca de fumo e conheciam bem
os presídios. Como quem está na rua precisa ajudar os ‘irmãos’ que estão
presos, os assaltantes deram dinheiro para o ‘partido’, mas isso não
quer dizer que o roubo ao BC financiou os ataques de maio de 2006, como
alguns dizem."
EXTORSÃO E SUICÍDIO
"O
José Edílson, vigilante do BC que recebeu R$ 2 milhões pelo crime, esse
coitado foi tão extorquido que decidiu se matar. O Deusimar, que
trabalhava com ele, foi preso e comentou na cadeia que o Edílson havia
ficado com parte do dinheiro. Daí os caras seqüestraram o Edílson e
tomaram dele R$ 500 mil. Depois, seqüestraram de novo e tomaram uns R$
300 mil. Daí ele deixou o dinheiro com o irmão, que era sargento da
Polícia Militar. Quando ele foi sequestrado de novo, disse que não
tinham mais nada e acabou liberado pelos seqüestradores. Uns policiais
descobriram que o dinheiro estava com o irmão e decidiram que iriam
seqüestrar o Edílson de novo. Ele descobriu, e nesse meio tempo se
suicidou."
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